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Superproteger é prevenir? Como posso ser um fator de proteção para as crianças e adolescentes?

Frustração!! Dor!! Sofrimento!! Mágoa!! Injustiça!!
O quanto nós queremos evitar a qualquer custo que alguém que amamos vivencie essas experiências? E se esse alguém for uma criança ou adolescente que amamos? Alguém ali do nosso círculo de relações, que convive conosco e que por vezes, faríamos de tudo para vivenciarmos nós o sofrimento e não permitir que eles passem por essas vivências.
Mas temos pago um preço muito alto por isso! Um preço caro demais!! E quem tem sofrido, é justamente aqueles que temos tentado proteger.
Temos visto jovens desmotivados, sem interesse pela sua própria vida, sem propósito e, muitas vezes, deixando-se levar pela convivência e pela opinião de outros jovens, por ídolos rasos e superficiais encontrados na Internet, os famosos Youtubers, e por séries, filmes, que tem ocupado um espaço de extrema importância na vida de nossos jovens, espaço que muitas vezes, aqueles que deveriam ocupar, acabam deixando vazios.
Estudos tem demonstrado que setenta e cinco por cento dos transtornos mentais tem início na infância e grande parte deles poderiam ser prevenidos.
Mas a grande questão é: onde tudo isso se junta? Qual o caminho que leva tudo isso a culminar em atos onde vemos nossos jovens tirando a própria vida, fazendo uso de drogas, tirando a vida de outras pessoas?
Nosso país está na contramão do mundo quando o assunto é Suicídio, ou, valorização da vida. Enquanto os números mundiais apontam para a queda nos números de suicídio ocorridos, o Brasil apresenta números ascendentes, com métricas que assustam, principalmente na faixa etária dos 15 aos 29 anos, sendo a segunda causa de morte dentro dessa faixa etária, ficando atrás apenas de mortes causadas por acidentes de trânsito. Todos os dias no Brasil, 30 pessoas tiram a própria vida.
A resposta para a pergunta feita acima não é única. Ela pode ter várias possibilidades de respostas, mas algumas, com certeza, são as principais.
A principal delas é a prevenção e parece clichê dizer que a base está na infância, mas está! Olhar para a infância como um período no qual podemos semear colheitas futuras, faz parte de todas as nações que cultivam índices altos de resultados positivos em saúde mental e em educação, bem estar e qualidade de vida.
Educar as crianças emocionalmente, é a principal maneira de prevenirmos transtornos mentais sérios futuramente, além de cuidar de quem cuida, ou seja, trabalhar com os pais, professores e com todos que tem o papel de estar na linha de frente com as crianças.
Quando falamos de educação emocional, falamos de ensinar as crianças a conseguirem identificar, manejar e lidar com suas emoções, ainda que elas não sejam positivas, como lidar com a raiva, tristeza, medo, saber resolver conflitos, enfrentar a frustração.
Quando conseguimos fazer isso, estamos proporcionando para essas crianças oportunidades de aprender habilidades de vida, habilidades de convívio social, desenvolvimento de autonomia e de independência e estamos dando condições a ela de se tornar um adolescente e um adulto mais resiliente e socialmente competente.
A resiliência, que é a capacidade que nós seres humanos, possuímos de enfrentar situações difíceis e conseguir superá-las, pode ser fortalecida através das oportunidades que são vivenciadas de superação e de fortalecimento, quando a criança resolve conflitos, busca solução para seus problemas e consegue se perceber como um indivíduo que possui seu poder pessoal e sua capacidade de resolver suas próprias demandas, sem precisar que alguém faça isso por ela.
Quando isso não é feito, quando realizamos pela criança algo que ela já é capaz de realizar, é como se estivéssemos dizendo a ela que ela é incapaz de conseguir superar algo e estamos favorecendo sentimentos de insegurança, medo e a dependência emocional, que a longo prazo poderá ser extremamente perigosa, quando essa criança, na adolescência, começar a se aproximar de amigos e ídolos (que naturalmente fazem parte do processo de formação de identidade do indivíduo na adolescência). Ao precisar de referência e de alguém que lhe forneça suporte, não sabemos em quem poderá buscar e onde encontrará essa referência.
Sem contar que adolescentes, adultos e até mesmo crianças, emocionalmente mais frágeis, possuem maior tendência a apresentar quadros de transtornos mentais como depressão, ansiedade, entre outros quadros que estão entre um dos principais motivos pelos quais uma pessoa pode cometer suicídio (a Depressão é um dos principais motivos que leva alguém a cometer suicídio).
Através de estudos atuais na área da saúde e da neurociência, sabemos que fatores como o ambiente em que a criança está inserida, pessoas com as quais ela convive, são fatores imprescindíveis para criar fatores de proteção que podem fortalecer esse adolescente futuramente. Ambientes com violência, estressantes, com negligência ou mesmo ambientes com características de superproteção podem se configurar em ambientes tóxicos e favorecer o desenvolvimento de transtornos mentais. Sabe-se atualmente que o ambiente pode ser ainda mais importante que a própria tendência genética.
Penso que agora é possível de compreender onde a superproteção, a infância e a prevenção se juntam, não é?
A Disciplina Positiva, nos coloca que todo ser humano, possui quatro necessidades básicas, que são, a necessidade de se sentir aceito e pertencente ao meio no qual se está inserido, a necessidade de conseguir desenvolver seu senso de poder pessoal e de autonomia, a necessidade de poder desenvolver e aprender habilidades de vida e habilidades sociais e ser educado de forma firme e gentil.
Mas ao ler esse texto, pode ser que algumas dúvidas possam surgir, como por exemplo: de que forma posso agir diferente com meu filho ou com meu aluno, de que forma posso ser um facilitador de emoções positivas e semear colheitas futuras que serão também positivas? De que forma posso conseguir possibilitar que a criança ou o adolescente consiga desenvolver as habilidades acima? Como posso conseguir no dia-a-dia prover para que as necessidades básicas acima sejam atendidas para as crianças e adolescentes com os quais convivo?
Vou deixar algumas dicas que podem ajudar:
– Procure deixar a criança fazer o que ela já consegue fazer, mesmo que ainda em pequenas tarefas. Utilize o seguinte lema: Nunca faça pela criança o que ela já consegue fazer por ela mesma! Isso irá proporcionar oportunidades de desenvolvimento de autonomia, aprendizado de habilidades de vida importantes, além de sentimentos muito positivos e uma sensação de que ela é capaz, de que ela consegue;
– Acolha, seja escuta ativa da criança, mesmo que não concorde com o que ela tem para lhe dizer, mas escute primeiro para depois se colocar e expressar sua opinião, sempre de forma respeitosa. Tal comportamento será de extrema importância na adolescência, quando eles crescem e precisam compartilhar e conversar sobre os grandes dilemas e dificuldades que encontram;
– Faça combinados em que eles tenham horários para a realização das tarefas pessoais e de suas responsabilidades, como estudo, tarefas de escola e tarefas de casa, quais as funções deles no dia-a-dia doméstico, no dia-a-dia da sala de aula. Tais aprendizados são importantíssimos para desenvolver a responsabilidade, a disciplina pessoal, senso de colaboração, ajuda, empatia;
– Esteja presente (presente de verdade), sem eletrônicos, só você e sua criança, brinque, jogue, dê risadas, vá passear, faça o que a criança goste e o que ela escolha. Isso gera conexão, confiança, vínculos e emoções positivas;
– Dê opções de escolhas limitadas, como permitir que a criança escolha entre duas ou três opções que você previamente selecionou para que ela sinta que é respeitada, valorizada e exercite a autonomia e a independência;
– Permita que sua criança fale sobre como ela se sente nas situações, e procure validar o que ela está sentindo. Nunca desmereça os sentimentos e emoções dela. Tente conduzir a percepção de que ela possa perceber se a maneira como ela agiu na situação foi adequado ou não após estar mais calma e você também. Se for preciso, peça um tempo e só volte após estar melhor para resolver a situação;
– Nunca e em hipótese alguma aja com violência e lembre-se que gritos, ameaças, humilhações e chantagens são também um tipo de agressão. Crianças criadas em ambientes onde há violência, possuem tendência muito maior a desenvolver transtornos mentais no futuro;
– Cuide de você. Quanto mais você estiver bem, mais conseguirá ser exemplo e espelho positivo para os comportamentos dela. Mais equilibrado estará e melhor condições terá de conseguir colocar em prática todas as dicas anteriores.
No fundo, todos nós podemos conseguir ser fator de proteção e auxiliar na prevenção dos transtornos mentais e do suicídio. Todos podemos colaborar na valorização da vida, ainda que em nossa própria casa com nossos filhos.
Mas também devemos estar atentos a qualquer mudança de comportamento e ou sinal diferente em nossos filhos e se caso isso acontecer, não deixar de buscar ajuda.
Um dos maiores aprendizados que podemos ter e deixar para nossas crianças é o de que não conseguimos dar conta de tudo. Somos uma comunidade de ajuda e podemos sempre pedir ajuda quando precisarmos. Aprender com nossas vulnerabilidades também é um dos maiores aprendizados que podemos deixar e a base para a resiliência. Afinal, aceitar que está difícil é começar a pensar na solução, não é mesmo?

Renata M. Lela – Psicóloga – CRP: 06/68519
Especialista em Psicoterapia Comportamental e Cognitiva Infância e Adolescência;
Especialista em Psicologia Clínica pelo Conselho Federal de Psicologia;
Educadora Parental em Disciplina Positiva e Primeira Infância pela PDA (Positive Discipline Association)/USA;
Facilitadora do Programa Educação Emocional Positiva e do Programa Ciranda;
Pós Graduanda em Transtornos Comportamentais Escolares;

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