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Robotização das Redes Sociais

Azuis, vermelhos, robôs e bolhas: Ponderações sobre dois polos de um mesmo limbo

Quem nunca se flagrou perdido em devaneios fantasiosos a respeito do futuro, com suas traquitanas eletrônicas e facilidades digitais? Como não se entusiasmar com filmes que narram a epopeia de máquinas, cada vez mais presentes nas ações humanas, nas mais ordinárias, como serviços bancários, às mais complexas, como viagens interplanetárias e o tão fetichizado teletransporte. Nada escapa à nossa criatividade, e, no campo tecnológico o infinito é o limite. E o é.
Neste sentido, qual seria a reação de alguém do século XIX ao desembarcar em nosso tempo, tomar conhecimento da existência da internet, de ferramentas de busca como o Google ou ainda das redes sociais? Aliás, há nestes três exemplos mais surpresas do que a maioria de nós, cidadãos do século XXI, podemos imaginar (inclusive membros mais novos, pertencentes às gerações Z e Alfa). A saber, em agosto último, uma pesquisa da FGV, de nome ‘Robôs, Redes Sociais e Política no Brasil’, revelou a influência de posts gerados automaticamente por robôs em episódios políticos determinantes da história recente.

Segundo o estudo, (…) esse tipo de conta chegou a ser responsável por mais de 10% das interações no Twitter nas eleições presidenciais de 2014. Durante protestos pelo Impeachment, essas interações provocadas por robôs representaram mais de 20% do debate entre apoiadores de Dilma Rousseff, que usavam significativamente esse tipo de mecanismo. Um outro exemplo analisado mostra que quase 20% das interações no debate entre os usuários favoráveis a Aécio Neves no segundo turno das eleições de 2014 foi motivado por robôs. (FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS, 2017 p.6)

Conforme o estudo, após os bots (forma como são chamados os robôs virtuais) terem seus perfis criados, rapidamente passam a seguir páginas de famosos, identificados com a linha ideológica programada, e adicionam outros robôs e usuários que curtem e comumente debatem conteúdos destas páginas. Depois disto, comentários de apoio, em páginas relacionadas ou críticas em páginas de orientação contrária à sugestionada aos robôs, fazem com que os debates inflamem e, mais usuários os adicionam a seus núcleos de amigos virtuais. Os bots, ainda conforme a pesquisa, atuam com mais volume e influência no Twitter, porque esta rede tem número de caracteres menor, por postagem, e por ser uma rede em que as pessoas buscam seguidores indistintamente (ao contrário do Facebook que permite os famosos ‘textões’ e pelo seu critério de adicionar apenas pessoas realmente conhecidas).

Para o leitor ou leitora que não conhecia este tipo de mecanismo – como eu até alguns meses atrás – assusta pensar que máquinas ou simplesmente programações digitais tenham papel tão relevante na ‘produção de opiniões’, e que estas, de alguma forma, balizam o que nós, seres humanos, pensamos de assuntos nossos, como por exemplo, a política. A pesquisa salienta que os agentes políticos, mencionados nos dados, não necessariamente estão diretamente envolvidos com a administração dos robôs. Os referidos mecanismos são utilizados também em outras frentes, além da política, de modo especial, no mercado, na promoção de marcas e produtos.

Outro fator que tem sido influente nos posicionamentos ideológicos são as chamadas “bolhas de informação”, verdadeiros redutos de opiniões gerados por algoritmos das plataformas digitais, que visam cercar o usuário apenas de opiniões semelhantes às deles. Na prática funciona assim: as redes sociais e sites de busca ‘percebem’ as páginas e comentários que um determinado internauta curte, além das pesquisas em sites e endereços digitais realizadas por ele. Com essas informações, monta um perfil com suas preferências e o condiciona a sempre receber notificações que se relacionem com este perfil. Com este modus operandi, o usuário vai, cada vez mais, se aproximando de quem pensa igual a ele e, obviamente, se afastando de opiniões diversas.
Experimente, por exemplo, buscar no Google sites de restaurantes vegetarianos. Além de propagandas de opções culinárias próximas de sua região, você receberá, em sua rede social, anúncios de lojas que vendem roupas para um público mais alternativo, além de receber notificações de bandas de estilo musical mais contemporâneo e propagandas de barbearias vintages – se for homem. O nobre leitor não receberá sugestões de páginas de candidatos políticos reacionários para curtir. Não que vegetarianos possam ser eleitores de candidatos de orientação neoliberal tradicional, mas porque comumente não o fazem, e o sistema já ‘sabe’ disso.

Em um cenário como este, somado à condição política brasileira – que conta com parcas opções partidárias ao centro – parece inevitável que a maioria das pessoas se alinhem à direita ou esquerda (obviamente que estas classificações ideológicas podem ser problematizadas, pois poucos destes partidos têm práticas fiéis a seus programas): é a chamada polarização, presente nas mídias digitais e nas ruas com mais contundência, ao menos, desde as últimas eleições presidenciais.
O debate de ideias é saudável e necessário para o exercício maduro da democracia. Enxergar que entre o vermelho e o azul existem infindáveis – e belíssimos – tons de roxos, violetas e magentas nos torna mais perspicazes às sutilezas do jogo político, e menos suscetíveis às canalhices de candidatos que se valem de nosso daltonismo no que se refere ao que é bom para a polis. Votar como se torce não é bom para ninguém, a não ser para os partidos, que assistem de camarote ao povo se digladiando com argumentos muitas vezes baseados em fake news ou em ideias criadas ou exponenciados por robôs.

Somos uma democracia jovem, ainda aprendendo como tudo isso funciona. Extremismos são perigosos, na medida em que não contemplam ponderações. Política é algo muito sério, para ser feito com as vísceras e não com o cérebro, tampouco com a ‘massa cinzenta’ de um provedor de inteligência artificial.
#eleicoes2018 #preocupado.

 

Por  João Carlos Teixeira, do Colégio de Santa Inês

Bibliografia:
Robôs, redes sociais e políticas no Brasil (recurso eletrônico): estudo sobre interferências ilegítimas no debate público na web, riscos à democracia e processo eleitoral de 2018 / Coordenação Marco Aurélio Ruediger. – Rio de Janeiro : FGV, DAPP, 2017.
(Encontrado em: http://dapp.fgv.br/wp-content/uploads/2017/08/Robos-redes-sociais-politica-fgv-dapp.pdf)
http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,redes-sociais-tem-de-responder-pela-polarizacao-que-causam,70001749156 (acessado em 1 de abril, às 20h32min

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