Cito, de uma entrevista com uma “evangélica” conservadora nos costumes, mas politicamente sensível ao social: A fé evangélica e a política: aposta à direita traz riscos. “Piercing, drogas, homossexualidade… Qual é o lugar de cada uma dessas coisas na sociedade e como elas se relacionam com a religiosidade? ‘Tudo o que eu penso e que diverge dos pensamentos cristãos é assunto de conversa com meu pastor. A gente conversa, ele me explica coisas do evangelho, me orienta e eu tiro minhas conclusões’”.
Cito este trecho nao apenas pelo interesse da entrevista, mas também porque penso nos jovens católicos: quantos são os que podem consultar tão facilmente seu “pastor”?
Na igreja Católica, via de regra, é considerado pastor o ”padre”, mas como é que você vai conversar com o padre que “administra” uma área de cinquenta mil pessoas, das quais dois terços se dizem católicas?
Me permitam um ajuste teológico. O pastor propriamente de uma “igreja particular” (diocese) é o bispo, ajudado pelos “presbíteros” (os sacerdotes) e pelos “diáconos” (que não são ajudantes dos sacerdotes, mas do bispo!). Mas, para o povo, o pastor é o padre, principalmente o pároco, que impossivelmente pode estar à disposição de todos pessoalmente, ainda que se disponha a ouvir confissões muito formalizadas, com poucas chances de se transformarem naquela orientação espiritual a que cada fiel tem direito.
Estudos psicossociais mostram que não se pode ter relacionamento pessoal com muito mais do que uma dúzia de pessoas. Falar livre e abertamente dos problemas da vida, da sociedade, da educação… só em círculos menores. E tais círculos precisam de alguém que anime, que dê orientação: de um sábio que tenha experiência ampla, além de suficiente conhecimento das riquezas da fé cristã (bíblia, grandes temas teológicos, pensadores cristãos e mesmo não cristãos, mestres de humanidade…). Numa pessoa assim deveria estar o ponto de apoio para os fiéis confrontarem sua fé com a vida. A monopolização na figura de padre tem muito a ver com o “poder sacramental”, a catequese sacramentalista e infantilizada e a estrutura ainda bastante feudal da Igreja universal e das igrejas particulares. O pastor ficou inalcançável.
Constato também que certos cristãos que conseguem se aproximar de algum padre têm tendência a cooptá-lo, ou até a monopolizá-lo para si, formando panelinha em redor dele, solicitando-o por mil coisas para as quais não se precisa de presbítero ordenado. Por exemplo: os casamentos. Para que ocupar os padres no fim de semana com cerimônias em que eles não são necessários (e que de espírito cristão muitas vezes não têm nada). Exatamente no momento em que os padres deveriam estar à disposição das ovelhas que mais necessitam. Os diáconos ou ministros extraordinários podem ser as testemunhas eclesiásticas do matrimônio que o Direito Canônico prescreve.
Mas isso ainda não resolveria o problema. Todos os fiéis deveriam ter próximo de si alguém que conhece bem o evangelho e a vida Igreja. Um teólogo leigo, um missionário qualificado, uma mulher sábia…
Uns trinta anos atrás havia mais crescimento nessa linha. Entretanto aconteceu uma clericalização. E a pastoral de comunidade cedeu lugar à pastoral da massa. Houve quem pensasse que para atingir os jovens e as almas simples bastava fazer show na televisão usando colarinho romano. Não adianta. O que as pessoas precisam é de um sábio cristão com o qual possam conversar e pensar, em vez de mexer sem pensar… Quem sabe olhe-se o diaconato permanente (preferencialmente de pessoas casadas, sem excluir solteiros ou solteiras) nesta perspectiva?
“Vou conversar com meu pastor”. Oxalá todos os católicos pudessem falar assim.
Por Johan Konings
Fonte: Dom Total